A obrigatoriedade de comprovação de virgindade para candidatas aos postos de delegado, escrivã e investigador, constante no edital de concurso público promovido pelo governo baiano, levou a seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil a emitir “nota de repúdio” contra a norma. “Essa exigência nos dias atuais é, extremamente, abusiva e desarrazoada em virtude da grave violação ao inciso III do art. 1º da Constituição Federal de 1988, que consagra o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, bem como ao art. 5º do citado Diploma Legal, que dispõe sobre o Princípio da Igualdade e o Direito a Intimidade, Vida Privada, Honra e Imagem”, diz trecho da nota, cuja origem é a Comissão de Proteção aos Direitos da Mulher da OAB-BA.
O item polêmico do edital pede “avaliação ginecológica detalhada, contendo os exames de colposcopia, citologia e microflora” às candidatas. Mas, esses exames são dispensados para as mulheres “com hímen integro”. No entanto, nessa situação a candidata terá que comprovar que é virgem, através de atestado médico, com assinatura, carimbo e CRM do médico que o emitiu.
A OAB alega ainda que “a imposição legal de critérios de admissão baseados em gênero, idade, cor ou estado civil configura uma forma gravosa de intervenção no âmbito da proteção à igualdade jurídica (CF, art. 5º, caput) e da regra que proíbe quaisquer desses requisitos como critério de admissão (art. 7º, XXX,CF), além das violações à Lei 9.029/95” e pontua: “exigir que as mulheres se submetam a tamanho constrangimento é, no mínimo, discriminatório, uma vez que tal exigência não tem qualquer relação com as atribuições do cargo, além de tornar mais oneroso o concurso para as candidatas do gênero feminino”.
Em entrevista ao site G1, o advogado, professor diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Celso Castro, questiona o pedido do exame ginecológico em um concurso público. “O primeiro questionamento que se há de fazer é se uma pessoa que tem um problema ginecológico está inapta para o concurso”, diz.
Para ele, exames ginecológicos não tem “nada a ver” com o exercício da função. Celso Castro acredita que a exigência se enquadra como uma violação constitucional “muito grave” porque interfere na privacidade e na intimidade do candidato. “O que eles [Saeb ou PC] deveriam ter era uma junta médica que examinasse a pessoa e revelasse se ela é apta ou não para a exercer a função. Não se pode exigir a descriminação das patologias específicas que alguém é portador, sob pena de quebrar a privacidade e intimidade da pessoa”, salienta.
Especialista em concursos públicos e direitos humanos, Sérgio Camargo ressalta que a mera previsão de se pedir exames ginecológicos dessa natureza e comprovação de virgindade, independente deste item do edital ser eliminatório ou não, já fere a liberdade de expressão sexual da mulher:
- Estão dando passos largos para trás. É uma limitação que pune o privilégio dado a mulher de procriação da espécie e endossa a manutenção da submissão das mulheres ao homem. Neste caso, teria que haver uma medida voltada também aos homens. Neste caso, como podemos comprovar a viirgindade do homem.
A Secretaria da Administração do Estado da Bahia (Saeb), responsável pelo edital, informou, por meio de nota, que os itens previstos no documento foram elaborados pela empresa organizadora do concurso, que é o Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (Cespe/UNB). No documento, a Saeb informa que “a inclusão da questão é padrão e recorrente em concursos públicos similares em todo o país e não se configura uma cláusula restritiva, mas sim uma alternativa para as mulheres que, por ventura, queiram se recusar a realizar os exames citados no edital”.
A Seab aponta que a cláusula é incorporada em diversos concursos no país para funções como analista administrativo, especialista em previdência e técnico administrativo, da Superintendência Nacional de Previdência Complementar, lançado em dezembro de 2011; além de para o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, de setembro de 2011.
O concurso disponibiliza 600 vagas, com salários variando de R$ 1.558,89 a R$ 9.155,28.
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